Na madrugada de 23 de abril de 1969, alguns dias após o início da Crise Académica em Coimbra, o autor catalão Ricard Salvat foi conduzido pela PIDE (polícia política do Estado Novo) a um posto na fronteira com a Espanha. Tal acontecimento interrompeu os planos da estreia de uma peça teatral, intitulada Castelão e a sua época, que havia sido preparada ao longo de meses, junto dos estudantes do CITAC (Círculo de Iniciação Teatral da Academia de Coimbra). Em outubro, meses após o início da crise, que também se tinha propagado durante o verão noutros eventos ligados à vida académica, alguns dos estudantes envolvidos foram forçadamente enviados para a Guerra Colonial, na África. Segundo conta o investigador Antonio Iglesias Mira, como forma de protesto foi organizada uma grande manifestação estudantil que marchou desde a Praça da República até a Estação Coimbra-B, cantando a versão de Cantar de Emigração, que integrava a peça de Salvat, e que se tinha tornado parte dos serões da vida estudantil. A canção — inicialmente musicada por José Niza — tinha como letra um trecho do poema ¡Prá á Habana!, da poetisa Rosalía de Castro, incluído na sua obra Follas Novas, publicada quase cem anos antes, em Cuba.
Reavivando fantasmas da História, esta bienal traz a gravação dessa canção de intervenção, por Adriano Correia de Oliveira (do álbum Cantaremos, 1970), para tocar diariamente, próximo do fim do expediente de muitas pessoas, na mesma estação onde outrora soaram as vozes dos estudantes opositores da ditadura. Neste lugar de idas e vindas, ressoam os versos que vêm para lembrar as aflições transversais às experiências migratórias — as quais marcam tanto quem vai quanto quem fica.
Estação Ferroviária Coimbra-B
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